Manter o peso após o emagrecimento é tão desafiador quanto perder os quilos a mais na balança. Por isso, o reganho de peso não pode ser assunto tabu e precisa ser discutido com informação responsável. Mas, afinal, por que é tão difícil manter o peso perdido?
Vários fatores colaboram para esse fenômeno. Um deles encontra explicação em nosso cérebro. Lá dentro, o hipotálamo entende que perder peso é algo ruim do ponto de vista da sobrevivência, pois a gordura é sinônimo de energia. Logo, se a pessoa perde energia, corre risco de morrer.
A partir desse mecanismo, o que o hipotálamo faz? Vai fazer de tudo para trazer de volta o peso corporal mais próximo ao peso máximo que a pessoa já teve na vida.
Além disso, também é importante destacar que quando perdemos peso em um curto espaço de tempo existe um aumento da fome em torno de quase cem calorias por quilo de peso.
Essa engrenagem funciona em qualquer método de emagrecimento. Mas na cirurgia bariátrica acontece algo diferente. O aumento da fome é registrado também, mas ao invés de cem calorias por quilo de peso, o aumento da fome vai ser de trinta calorias por quilo de peso. A bariátrica proporciona a regulação da ação do hipotálamo em obrigar nosso corpo a buscar o peso máximo. Por isso a intervenção é considerada mais eficaz, seja do ponto de vista do peso perdido ou da manutenção dele.
“Importante entender esse conceito porque muitas pessoas ainda veem a cirurgia de forma equivocada. Para elas, a fome e a vontade de comer são as mesmas de antes da cirurgia, mas existe uma barreira pela diminuição do tamanho do estômago. Isso não é verdade. Com a bariátrica, passa a existir também impacto dos hormônios no cérebro, o que é fundamental para entender a eficácia da cirurgia. Porque a intervenção não é só voltada à mudança na anatomia do trato digestivo. Há mudanças hormonais, metabólicas, entre outras”, explica a cirurgiã Luciana Siqueira.
A médica reforça, ainda, que nenhum estudo demonstrou que essa adaptação buscada pelo hipotálamo se dissipou com o tempo. Ou seja, o corpo sempre vai tentar retornar ao peso máximo.
O alerta também vale para o “combo” falta de exercício físico, ansiedade e compulsão alimentar, considerado de alto risco para o paciente que perdeu peso. “É preciso entender que o exercício físico diminui a ansiedade, pois libera endorfina e ajuda a reduzir a vontade de comer”, completa a médica.
O debate, diz Luciana Siqueira, é importante para evitar a culpabilização das pessoas em processo de enfrentamento da obesidade e a armadilha de métodos “milagrosos” de emagrecimento.
É dia de consultório. Nas redes sociais, a médica Luciana Siqueira costuma postar imagens da própria sala acompanhadas de frases acolhedoras para os pacientes que estão para chegar. Há 18 anos, a cirurgiã bariátrica opera pessoas com variados graus de obesidade na rede pública e privada de saúde. Na consulta, alguns choram enquanto relatam suas limitações físicas ou dores emocionais relacionadas à obesidade. Os sentimentos predominantes são de culpa, vergonha, frustração e fracasso por não conseguirem controlar a doença.
Até 2035, mais da metade da população mundial terá sobrepeso ou obesidade, de acordo com o Atlas Mundial da Obesidade de 2023. Por trás dos números frios, estão histórias reais de pessoas enfrentando ansiedade e depressão. Sintomas agravados em meio a uma sociedade gordofóbica, que não aceita pessoas fora de um determinado padrão.
“O estado de saúde mental desequilibrado é a maior dor que eu encontro nos pacientes. Eles se sentem incapazes e fracassados por não conseguirem lidar com a doença. As limitações físicas também levam a condições emocionais sofridas”, explica a médica.
Luciana Siqueira destaca que o enfrentamento da obesidade não é apenas sobre perder peso ou estética. É sobre ganhar anos de vida com mais saúde. Segundo a médica, a obesidade está relacionada a várias comorbidades, tais como hipertensão, diabetes, apneia do sono e alguns tipos de cânceres, um dos assuntos de pesquisa da médica. “Quando me questionam sobre um paciente com obesidade com exames de sangue normais, explico que, mais tarde, o quadro de saúde dessa pessoa provavelmente vai mudar e ela vai desenvolver outras doenças. Pessoas magras, obviamente, podem apresentar quadros de saúde comprometidos, mas a obesidade é um fator de risco a mais”, explica.
A doença, diz Luciana, é tão cruel que os pacientes pensam que, no dia seguinte à cirurgia, estarão magros e esquecem de pequenas conquistas diárias com a perda de peso, como caminhar sem se cansar, atacar um cadarço sem dificuldade, entre outras atividades. “Por isso é tão importante ter do outro lado uma equipe que saiba escutar o paciente para mostrar para ele os pequenos avanços no dia a dia e não falar o que o paciente deseja ouvir.”
O câncer de mama também pode ter relação com a obesidade nas mulheres.
O alerta é da médica Luciana Siqueira, cirurgiã bariátrica há 18 anos, nas redes pública e privada de saúde, e vice-coordenadora do Programa de Residência de Cirurgia Bariátrica do Hospital das Clínicas.
Desde 2014, quando concluiu a tese “Associação entre obesidade e câncer: análise proteômica”, a médica vem alertando para o assunto, que precisa estar cada vez mais em evidência. Isso porque, até 2035, mais da metade da população mundial terá sobrepeso ou obesidade, de acordo com o Atlas Mundial da Obesidade de 2023.
“Cheguei à conclusão que, na amostra estudada, foram identificadas proteínas potencialmente carcinogênicas nos pacientes com obesidade e que a perda de peso induzida pela cirurgia bariátrica promoveu o desaparecimento dessas proteínas”, destaca a médica.
Luciana Siqueira alerta que a intervenção cirúrgica é uma ferramenta eficaz no controle da obesidade, mas exige um acompanhamento multidisciplinar, incluindo nutricionista e psicólogo, além de prática de exercícios físicos. “A bariátrica não é apenas sobre perda de peso na balança. É sobre mudança de estilo de vida e ganho de expectativa de vida também”, afirma.
Para prevenir o câncer de mama, a médica também alerta para a importância da prática de exercícios, alimentação saudável, com frutas, verduras, legumes e fibras. Importante, ainda, evitar o consumo de açúcar, alimentos processados e ultraprocessados, além de ingestão de bebida alcoólica em excesso. Além disso, é preciso fazer os exames periódicos, como orienta o Ministério da Saúde.
ENDEREÇO
> REAL HOSPITAL PORTUGUÊS